quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Era tudo tão difícil, tão difícil, que, exausta, eu desisti.
Isso não quer dizer que eu deixei de amar. Isso quer dizer que eu desisti de sofrer. E, quem sabe, também, de causar sofrimento.
Ana.
Meu abismo seu
Seu abismo eu
Cheiro de medo
O buraco negro do olho
Me contou a verdade do outro
Me jogou no furacão do rio
Da flor que sai do poro
No meio do arrepio
Meu abismo seu
Seu abismo eu
é o que levanta a poeira, menino
O sino da minha cadeira
Mas a poeira
É só a vontade do chão de voar
Mas a cadeira
É só a vontade de descançar.

Ps: Não tenho medo dos abismos debaixo dos meus pés. Eu sei cair, eu sei voar.

Para Maria Ana, ou Mariana

Sua unha arranha
Os meus discos de amor
Sua vitrola solando
O avesso da dor
Tudo que eu não sei te cantar
Tudo que não consigo falar
Seu barulho gozando
O seu olhar me suando
Tudo que eu não sei cantar
O meu silêncio urrando
O seu nariz desconfia
Do meu querer
Tudo que eu não sei fazer
Tudo que vou aprender
O seu amor
Enfia em mim.
Tudo que não sei gritar
Tudo que não sei chorar
O seu nariz desconfia
De quem conserva a agonia em estado de moinho
De quem move o sorriso da barriga em abismo
A beira da queda
A um passo do céu
Próxima demais da finitude
Co-ciência de miudezas
Transitando no silêncio da defesa

"Caio por ti"

É preciso ter um dom divino para se cair na solidão das coisas.Eu caio sóh, e nada é mais bonito que cair só.
Rio
De um janeiro longínquo
Rio de cristos, de vincos
Na minha existência
Vê se me explicaSe renda
Em todas as suas facetas
E estreite suas alamedas
Até o alcance da envergadura
De meus braços abertos
Que é pra eu sentir a superfície dura
Desses seus segredos.
Deixe-me ir andando e sentindo
Com atenção de ponta de dedos
De um lado o chapiscoA fuligem, o risco
Do outro as curvas das morenas
Dos arcos da Lapa, o riso
A Urca, o mar de Ipanema
A solitude dos nossos recreios de varandas
E todas as coisas que se tocam:
A bossa, o samba, os corpos
Com suas bocas e falos
Ventando seus mistérios, seu som
Seu tom - Antônio Carlos,Rio, é sério:
Você, que é tão grande que não coube
Em só uma canção
Foi se alojando, santo e ébrio
Sem sobras e sem cerimônia
Nas minhas horas
Memórias
Meus foras
E meu coração.
Por favor Rio, me livre de pedir
Perdão

Para Kiari

Quando você se sentir sozinho, menino de chuva, pegue o seu lápis e escreva. No degrau de uma escada, à beira de uma janela, no chão da calçada. Escreva no ar, com o dedo na suas gotas, na parede que separa o olhar vazio do outro. Recolha a lágrima a tempo, antes que ela atravesse o sorriso e vá pingar pelo queixo. E quando a ponta dos dedos estiverem úmidas, pegue as palavras que lhe fizeram companhia e comece a lavar o escuro da noite, tanto, tanto, tanto… até que amanheça.
Ei você, vem comigo que eu vou te ensinar a dançar o silêncio. Você precisa aprender, como eu aprendi, a escutar o som das cores, o som da mudez. Esse barulho perturbador que toca aqui, todas as noites, desde que as cordas do violão cortaram seus pulsos. Confesso que foi trabalhoso e doloroso me acostumar a o...uvir o vermelho sem chorar.
Ana

Sem o "Tay" sou "Ana"

Em o "Tay" eu sou "Ana"

Palavras escritas por mim, ou melhor, escritas po Ana, minha personagem em "As Horas Vulgares"

Mais que de carne, osso, sangue, veias, sexo
Sou feita da ausência
Ausência pontuda, rasgada e ardida
Minha extensão toda loucura rompendo a pele
Vindos dos debaixos da alma.
Não há calma, sempre taquicardia
Nunca é dia, ninguém se aproxima
Do breu, da noite que me tornei.
Me arrasto no movimento quase intangível de mil perninhas
Meus passos de bailarina mofada, que fugiu da caixinha
Sobre o chão liso demais das faltas mais fundas.
Dentro da minha noite aguda, Gil dorme pra sempre.
Muda de posição, sofre seus espasmos noturnos
Sonha descaradamente
Diante de meus olhos insones
Diante da minha fome
Da minha estranha arquitetura de agulhas
Veneno, inflamação
Chamas, incêndio, sirenes, pavor, tesão
Amor.
Enxame de abelhas, canteiro de obras
Escombros
Uma parede emassada ali
Muitos pregos.
Um quadro da mãe que acordada para sempre, me zela muda, sem sorriso.
Mel escorrendo grosso pelo pé direito
Pelo lado de dentro.
Por fora só esse silêncio.

Ana Vulgar