quinta-feira, 22 de setembro de 2011

A menina menino

Ela cuida do estoque de dois cafés localizados na saída das barcas, um no rio, um em Niterói. Ela gosta de livros de menino, o seu preferido é Harry Potter e ela ri perplexa, toda vez que flagra um ângulo Hermione em mim. Ela tem o cabelo preto e curto, as unhas curtas e nunca feitas, ela dorme de samba-canção e usa roupas de menino. Antes de dormir e quando acorda comigo, olha boba e risonha para mim, de um jeito que só um menino olharia, de um jeito que só um menino pré-adolescente olharia. Ela me olha como se eu fosse uma mulher, ela que é tão mais velha do que eu. Nessa hora me sinto uma mulher, uma professora que se encantou pelo aluno bobinho e está brincando com ele de descoberta. Ela me quer o tempo inteiro, ela largaria os cafés para ficar comigo o dia inteiro. Mas ela não imagina, ela nem supõe quem de fato sou, para onde vou e eu não posso contar. Ela não entenderia, ela que por encanto não houve uma palavra que digo, que se arrepia feito um menino na puberdade com cada movimento sedutor que eu faço, jamais poderá ser aquela a ler meus diários, a flagrar minha escuridão, a dançar valsa com a minha loucura. Mas ela tem sido minhas férias, minhas férias dessa profundeza de gentes que sou, ela pode ser minha festa de fim de semana, pode ser minha pausa de dedos, pode ser a minha versão novela, a minha versão best seller, a minha versão música pop... Pode ser o meu fiel para eu brincar de deusa, uma deusa boba e embriagada que faz o que bem quer com a sua criação. Ela pode ser um descanso de mim, e sim, eu quero isso, e dessa vez, mais do que nunca, eu quero só agora.

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