sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Adptando Carpinejar

Pra você que é covarde


Você foi covarde. A coragem não vem depois. A coragem vem antes ou não vem. Não posso amaldiçoar sua covardia. Sua boca não é firme como suas mãos para me agarrar. Minhas pernas não são tão rápidas quanto minha boca para lhe impedir. Você é covarde. Pela gentileza de sempre dizer sim, repetidos sim, quando não estava ouvindo. Eu recuso sua covardia, ela não me serve mais. Porque não fui escolhida, não eu de fato. Não te colocarei no colo. Não a ajudarei no parto. partirei. Serei aquela que deveria ter sido, enterrada sem morrer, a que desapareceu permanecendo perto. Sou seu constrangimento mais alegre. Sua ferida, seu feriado. Com o tempo, serei sua vontade de se calar. De se retirar da sala de ensaio, de não entrar, de não assistir as horas vulgares. Não conhecerá meus hábitos novos. De coçar o nariz expulsando a vontade do chão de voar. O que é imenso é estreito. O que é infinito fecha. Até o oceano tem becos e ruas sem saída. Até o oceano. Sua esperança não diminui a covardia. Quer um conselho? Finge que a dor que sente é a minha para entreter sua dor. Saudades ficam violentas quando mudamos de endereço. Saudades ficam insuportáveis quando mudamos de sentido.Você não saberá que estou mudando, que consegui ir pra lá, onde eu queria ir.
Você confunde sacrifício com covardia. Compreendo. Eu confundo amor com loucura. Cada um tem seus motivos, sua maneira de se convencer que fez o melhor, fez o que podia. Você me avisou que não tinha escolha. Nunca teria escolha. Você foi educada com a vida, pediu licença, agradeceu os presentes. Confiou que a vida logo a entenderia, retribuiria. E cederia. Engoliu uma palavra para dormir. Não serei vizinho de seu sobrenome. Seus nomes esperam um único nome que ficou para trás. Você não desencarnou, não se encarnou, deixou sua carne parada nas idealizações. Morrer é continuar o que não foi vivido. Vai me continuar sem saber. Você foi covarde. Com sua ternura pálida, seu medo de tudo, sua polidez. Você não aprendeu a mentir. Tampouco aprendeu a dizer verdade. O dia está escuro e não desligarei o ar. O dia está lento e não haverá movimento nas ruas, nem cinema, nem poema, nem abraço, afago ou japonês. Você não revidou nenhuma das agressões, não revidará mais essa. Você é covarde. A mais bela covardia de minha vida. A mais comovida. A mais dolorida. O que me atormenta é que fui capaz de amar sua covardia. Foi o que restou de você em mim.

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